Instituto Eqüit participa de Reunião da Sociedade Civil sobre Tributação e G20

A Reunião da Sociedade Civil sobre G20 e Tributação Internacional, ocorrida nos últimos dias 22 e 23, foi resultado de convite feito pelo Ministério da Fazenda do Brasil a diversas organizações da sociedade civil, nacionais e internacionais, para contribuírem com suas demandas ao tema da Tributação Internacional, por ocasião da presidência brasileira no G20. 

É a primeira vez na história que a Trilha Financeira do G20 acolhe demandas da sociedade civil e é também a primeira vez em que se discute a taxação de grandes rendas e riquezas nesse fórum, dois grandes avanços conquistados pela liderança brasileira. As instituições presentes reiteraram a importância da taxação dos super-ricos, medida que vem sendo defendida pelo Brasil, na Trilha Financeira do G20, baseada em proposta do economista Gabriel Zucman (Comissão Independente para a Reforma da Tributação Corporativa Internacional / Observatório Fiscal da União Europeia), consultor do governo brasileiro para o assunto.  

O evento contou com mais de 120 participantes, e as entidades entregaram ao final uma carta ao Ministro da Fazenda do Brasil, Fernando Haddad, com uma série de recomendações para a reforma da tributação internacional, ressaltando a importância da progressividade tributária, da taxação de grandes rendas e riquezas, do combate à elisão e evasão de divisas para o exterior, da tributação da economia digital, de combustíveis fósseis e demais produtos danosos, da garantia de direitos humanos e de objetivos ambientais como balizadores da tributação, e de espaços internacionais democráticos, como a UNFCITC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Cooperação Tributária Internacional).
Os dois dias de evento tiveram quatro mesas de debate, com a participação de membros do Ministério da Fazenda, da Autoridade Fiscal do Brasil, e de instituições da sociedade civil, dentre as quais Inesc, Center for Economic and Social Rights (CESR), Instituto de Informação e Negociações Comerciais da África Austral e Oriental (SEATINI), CUT, Latindadd, OXFAM, Gestos, Tax Justice Network, Internacional de Serviços Públicos e Centro de Pesquisas em Macroeconomia das Desigualdades (MADE-USP), bem como diversas intervenções do público, em nome de movimentos sociais de mulheres, imigrantes, população em situação de rua, dentre outros.
Destacamos algumas falas dos debatedores e do público.
Antonio Lisboa, da CUT, lembrou dos países menores, que não participam do G20: “trabalhadores de outros países nos fizeram um apelo para que o G20 e o L20 [grupo do G20 que representa os interesses dos trabalhadores] olhe para aqueles que não fazem parte do G20 e que serão afetados pelas decisões aqui tomadas. Faço um apelo também para que esse processo tenha continuidade, uma vez que o G20 parece que inicia discussões que se desenvolvem ao longo do ano e terminam ao fim do ano.” Ressaltou ainda um fato triste da nossa época: “parece que a única instituição multilateral que se fortalece no mundo é a OTAN, o que é uma vergonha”.
Adrian Falco, da Rede Latindadd, lembrou que de nada adianta estabelecer um imposto mínimo global se a base tributável é enviada para o exterior. “De que base tributária estamos falando?”. Além disso, atentou para o fato de que a política é que norteia as questões técnicas, e portanto, a nossa discussão deve ser primeiro política, depois técnica.
Maria Emilia Mamberti, do Center for Economic and Social Rights (CESR), disse que para além do debate sobre tributação de empresas, é fundamental falarmos dos impostos às pessoas físicas, algo bastante subaproveitado na nossa região, a América Latina. Ressaltou ainda que é necessário descolonizar o sistema tributário e mover as discussões para a ONU que é um ambiente minimamente democrático, diferentemente da OCDE.
Flavio Lino, Secretário Municipal do Movimento Nacional da População em Situação de Rua (MNPR), salientou que nos 17 ODS não há nenhum específico sobre a população de rua, uma população de mais de 150 milhões ao redor do mundo e que está sendo severamente afetada pelas mudanças climáticas. Argumentou que o Brasil e o governo Lula são vanguarda na defesa dos direitos da população de rua, mas que faltam esforços no âmbito do G20 em prol dessa população.
Pedro Rossi, professor de Economia e diretor do Think Tank Transforma, salientou a importância de trazer a dimensão da garantia de direitos para o debate fiscal, uma vez que desigualdade é algo sempre relativo enquanto direitos são absolutos. Assim, para além de diminuir a desigualdade, é fundamental estabelecer que se houver direitos a serem garantidos, recursos financeiros e materiais devem ser mobilizados para tal.
Adhemar Mineiro, da Rebrip, falou sobre a importância de que o debate sobre taxação progressiva esteja conectado à um modelo comprometido com o desenvolvimento e não com a austeridade. Dão Pereira Real, do Instituto Justiça Fiscal, ressaltou que esse é um debate que deve ser apropriado pelos movimentos sociais e pela sociedade civil, uma vez que os super ricos não irão taxar a si mesmos. Observa ainda o fato de que há décadas não conseguimos resolver dois problemas básicos no país, o da taxação de grandes fortunas e o retorno da taxação de lucros e dividendos. Finaliza ressaltando que em dados do ano passado, R$ 670 bi foram distribuídos como lucros e dividendos de forma isenta, apenas para brasileiros.
A economista do Instituto Eqüit e da Rebrip, Isabela Callegari, participou como debatedora da proposta de Gabriel Zucman, de um pacto internacional para a tributação da riqueza, salientando os impactos nocivos do sistema tributário atual, regressivo, na vida das mulheres, agravados por um contexto de austeridade fiscal, privatizações e de crise dos cuidados, onde as mulheres, ainda responsáveis pelo trabalho de cuidados não remunerado, veem sua renda e tempo disponíveis encolhendo, ao mesmo tempo em que pagam cada vez mais pelos serviços privatizados e pagam proporcionalmente mais tributos, se endividando para sobreviver. A taxação das grandes rendas e riquezas não é apenas um passo imprescindível para a justiça social e ambiental, mas também, em termos macroeconômicos, é uma compensação aos juros da dívida pública que são pagos à parcela mais rica da população, e, dessa forma, a tributação dos ricos constitui também uma forma de equilibrar uma injustiça exacerbada pelo próprio sistema monetário.
Livi Gerbase, do Centre for International Corporate Tax Accountability and Research (CICTAR), mostrou que, em cinco anos, apenas 5 famílias bilionárias brasileiras receberam R$22 bilhões de forma totalmente isenta, e Sergio Chaparro, da Tax Justice Network (TJN), argumentou que é falaciosa a ideia tantas vezes difundida de que países do Sul global seriam mais corruptos, uma vez que são predominantemente os países do Norte global que se beneficiam de paraísos fiscais e sigilo de informações.
Os membros do Ministério da Fazenda presentes reiteraram que a taxação dos super-ricos em escala global é uma pauta prioritária para o governo na presidência do G20, e que estamos em um momento histórico propício, no qual a maioria dos governos se apresenta como favorável à proposta, a depender do seu desenho. Seguimos na luta para que não apenas se implemente uma tributação justa a nível global, como para que os recursos sejam investidos de maneira democrática e em prol de uma sociedade mais igualitária e sustentável.
(Crédito Fotos: André Corrêa / Ministério da Fazenda)

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